sexta-feira, 21 de setembro de 2007

Nivelando por baixo II

Que o Brasil é a república da nivelação por baixo, da valorização do coitado, do imbecil em detrimento do competente e capaz não é nenhuma novidade. Mas a velocidade com que certas atrocidades populistas vêm sendo cometidas nestes últimos meses tem me assustado bastante.

Primeiro foram as cotas racistas na UFRGS, o mensalão do ensino superior brasileiro: se a tua universidade adere, ganha um repasse maior. Agora essa ridícula unificação da língua portuguesa.

Li em alguns lugares gramáticos, intelectuais e escritores dizendo que, com essa reforma, a última flor do Lácio ficaria menos inculta, mais regular. Não é necessário se aprofundar muito em questões ortográficas para ver a enorme besteira contida nessa afirmação. Basta ver o caso da abolição da trema.

A trema serve, principalmente, para, indicar quando as consoantes G e Q - ao serem seguidas pela vogal U - são duras (fortes) ou fracas. Se ela aparece, U deve ser pronunciado, tornando a consoante antecedente fraca. Se ela não aparece, o U deve ser mudo e a consoante deve ser dura. No primeiro caso, temos palavras como lingüiça, na qual o U deve ser pronunciado; no segundo, temos conquista, na qual o U é mudo e o Q é pronunciado forte, com a sonoridade de K.

Ao riscarmos a trema dos nossos acentos, ficará impossível distinguir a ocorrência ou não de G e Q fracos ou fortes. Em outras palavras, pronunciar corretamente uma palavra através de sua leitura, dependerá de conhecimento prévio de sua fonética. Como teríamos certeza de que lingüiça se pronuncia como lingüiça e não linguiça se nunca tivéssemos ouvido essa palavra antes? Com a trema, jamais teríamos tal dúvida! Sem a trema, a dúvida aparece, pois sempre haveria duas pronuncias possíveis: com o U aparente ou com ele mudo. Assim, a queda do trema gera a irregularidade.

Mais uma vez, o país retrocede e faz o contrário. Premia a vagabundagem, o desleixo e tripudia em quem leva as regras a sério e se esforça - este está fadado a ser o eterno CDF caricato, motivo de chacota pela turma da escola. Ao invés de melhorar o ensino básico, facilita o ingresso no superior. Ao invés de melhorar o ensino da língua portuguesa nas escolas, a simplifica.

Nestas horas eu penso no pobre que sempre foi aluno esforçado e, apesar das adversidades que a condição social lhe impôs, conseguiu êxito e alcançou uma vaga na Universidade pública. Graças a esse governo de merda, populista e bem intencionado, o sujeito do meu exemplo vai se foder a vida inteira, carregando a aura do deitado, do sem-vergonha, do vagabundo, por ter sido justamente o contrário! À cretinice tudo, ao mérito nada!

Vergonha nacional é pouco!

11 comentários:

Risco disse...

como tu de ve saber, terá mudanças tambem na linga em Portugal( e outros paises de lingua portuguesa: "cerca de 40 mudanças que terão de ser incorporadas ou à ortografia brasileira ou à portuguesa."
Bem que os portugueses poderiam incorporar a trema e não nós retirarmos.

Outra mundaça pior: "Não se usará mais o acento circunflexo nas terceiras pessoas do plural do presente do indicativo ou do subjuntivo dos verbos "crer", "dar", "ler", "ver" e seus derivados. A grafia correta será "creem", "deem", "leem" e "veem"."

O que tu acha desse comentário sobre a unificação?:
"Afinal, estimula-se assim a mobilização em torno de um fator de identidade nacional e a conscientização da vitalidade do idioma e dos traços comuns entre as culturas que se expressam por meio dele. Isso tende a fazer surgir um maior intercâmbio entre as obras literárias produzidas nesses países."

Unknown disse...

pesoalmenti eu sou a favo desa mudansa. pu mim pudia simplifika inda mais! ai sim, ningem ia mais si sinti ignoranti, todu mundu ia iscreve sertu! inda sonho kum um pais onde a leitura obrigatoria pru vestibula das universidadi publika seja paulu kuelhu...

Pato disse...

Quanto ao comentário, creio que seja justamente o contrário. A unificação provoca uma perda da identidade nacional ligada à língua. A parte quanto aos traços comuns entre as culturas é patéticos; a única coisa em comum que temos é justamente o idioma.

"Isso tende a fazer surgir um maior intercâmbio entre as obras literárias produzidas nesses países."

Besteira, qualquer das variações do português é compreensível a qualquer pessoa alfabetizada no idioma. A língua nunca foi, nos dias de hoje, um empecilho à disseminação de livros, tanto que os livros mais vendidos e lidos no Brasil atualmente não são de origem lusófona.

Anônimo disse...

tchau, fui e não volto mais.

larguei de mão mesmo.

Brose disse...

sou contra essa unificação

lilly disse...

Eu sou a favor de aproveitar a deixa e fazer uma "Língua Brasileira" e deixar Portugal e os outros países (se quiserem) com o Português sem tremas e sem o acento circunflexo nos casos citados no outro comentário.
Eu leio Saramago, blogs e outras coisas de Portugal sem nenhuma dificuldade.
Quanto às cotas e demais nivelações por baixo, concordo plenamente com o que escrevestes, simplesmente ridículo esse país.

Amy Mizuno disse...

Escuto essa do trema desde minha terceira série do ensino fundamental. Entretanto, a língua é dinâmica, sempre permite alguns ajustes na margem. Ou pretendes que retornemos com o português arcaico que ainda mantinha até mesmo os partitivos ainda presentes no fraçês? (devil's advocate)
hehehehe
"Nestas horas eu penso no pobre que sempre foi aluno esforçado e, apesar das adversidades que a condição social lhe impôs, conseguiu êxito e alcançou uma vaga na Universidade pública."

Nessas horas eu penso nos pobres em que apliquei o questionário sobre pobreza e me responderam que consideravam o estudo importante, entretanto, estava claro, pra mim, o fato deles jamais terem condições de chegar à UFRGS. Não existe mérito nenhum em nascer em "berço de ouro", em cumprir com o mínimo que uma pessoa que teve acesso a todas as condições deveria. Não estamos em uma sociedade em que é simplesmente uma questão de escolha. O agente opta por se dedicar ou não. Não no momento em que uma pessoa adoraria estudar, mas a preocupação predominante é se ela e sua família não morrerão de fome no dia seguinte.
Eu não sou a favor de cotas, contudo, considero essa análise demasiada infeliz.

Pato disse...

Tinha escrito uma resposta para o teu comentário, Xuli. O Blogger fez o favor de perdê-la. :/

Mais tarde escrevo de novo.

Risco disse...

é sempre bom dar ctrl+c antes de clicar

Risco disse...

o sujeito pobre desse exemplo do Pato, é uma exceção, não é?

Barbara Dalalana disse...

quem inventou essa mudança, não tinha nada melhor pra fazer